Para interpretar uma parábola
vários elementos deverão ser considerados. Sobre o formato das parábolas,
podemos listar pelo menos seis tipos diferentes, segundo (BAILEY, 1995). Ao observar o contexto imediato da parábola do Rico e Lázaro
podemos concluir que o formato dela se enquadra numa parábola em um diálogo
teológico.
O tema deste
debate era a questão da avareza. Jesus havia começado a discussão com os
fariseus e escribas (Lc. 15:2) por causa da crítica deles sobre o
relacionamento que era mantido com os publicanos e pecadores. Havia murmuração
contra Cristo por causa disso. Jesus então começa a contar uma série de
parábolas para se defender e explicar o assunto, que são a Parábola da ovelha
que se perdeu, a da mulher que perdeu uma dracma e a do filho pródigo (Lc. 15).
Continuando o
debate Jesus conta uma parábola de um administrador que era infiel, e então o
tema é desviado para a questão da riqueza e do apego à ela. Quando Jesus
termina de contar a parábola do administrador infiel, ele conclui que ninguém
pode servir a dois senhores (Lc. 16:14), e nesse momento os fariseus começaram
a ridicularizar, pois segundo Lc. 16:14 eles eram avarentos.
A parábola do
Rico e Lázaro é justamente para tratar dessa questão do apego à riqueza e dos
bens materiais. De acordo com o texto bíblico em momento nenhum o assunto foi
sobre vida após a morte. O tema é sobre as consequências de uma pessoa que é
avarenta em contraste com alguém que não seja. Usar a parábola do Rico e Lázaro
para defender doutrinas relacionadas à vida após a morte e ignorar o tema
teológico que é tratado por ela.
Argumentando á favor de uma
parábola, Banzoli, lista algumas constatações falaciosas de uma análise
puramente literal do texto em estudo:
Os mortos partem para o outro mundo não como
“espíritos”, mas com o seu próprio corpo com dedos, línguas, etc; os
“espíritos” sentem sede; ser rico é motivo de ser mandado ao inferno, apesar de
ter demonstrado tão grande benevolência para com o pobre Lázaro e a própria
parábola nada dizer de que o Rico era um homem mau; ser mendigo é passaporte
para o Céu; o Céu e o inferno ficam um bem do lado do outro; Apesar de haver um
“abismo intransponível” entre ambas as partes, os salvos podem ficar
conversando a vontade com os ímpios que estão queimando no inferno; o mediador
não é Jesus, mas Abraão, para atender o chamado do rico; se os mortos partem
para o “Seio de Abraão”, então Abraão morreu e partiu para o seio dele mesmo;
para onde iam os que morriam antes de Abraão? (2013, p. 101).
Na interpretação das parábolas é importante ressaltar alguns
princípios e pontos. Cada parábola é
classificada em três categorias: símiles - pequenas comparações entre dois
objetos usando-se o tempo presente (Jesus compara o reino de Deus a atividades
da vida, por exemplo); parábolas propriamente ditas - histórias completas,
narradas no passado, com significado metafórico; ilustrações exemplares -
narradas no passado, caracterizando um exemplo a ser seguindo, sem significado
metafórico. As duas últimas categorias são narrativas fictícias as quais não
podem ser usadas para sistematizar doutrinas teológicas, mas,
possuem apenas um ponto chamado de tertium
comparationis (termo de comparação), que faz a parábola (veículo) ser
direcionada para um tema (mensagem). A busca pelo Sitz im Leben Jesus - o
público, a situação do pronunciamento de cada parábola torna-se importante para
seu estudo igualmente (JEREMIAS, 1972).
A
complexidade no
estudo de uma parábola pode-se notar ao encontrá-las em um diálogo teológico,
em um evento narrativo, numa história de milagre, numa coleção topical, num
poema ou numa parábola em si. Esta é uma ênfase nas parábolas como funcionais
em relação a um ensinamento maior e, portanto, precisam ser interpretadas
levando-se em consideração os seguintes passos (BAILEY, 1995):
a - determinar o auditório a
quem Jesus está direcionando seu discurso: escribas, fariseus, multidões ou aos
discípulos;
b - examinar o
contexto/interpretação propiciados pelo evangelista ou sua fonte;
c - identificar se há uma
"peça dentro da peça" e observar a parábola em dois níveis: o debate
teológico entre Jesus e o seu auditório e o uso que Jesus fez de parábolas para
se comunicar com aquele auditório naquele debate;
d - discernir os
pressupostos culturais da estória, tendo em mente que os seus personagens são
aldeões palestinenses.
e - ver se a parábola se
divide em várias cenas e observar se os temas constantes das diferentes cenas
se repetem segundo algum padrão discernível.
f - discernir quais os
símbolos que o auditório original teria identificado imediatamente e
instintivamente na parábola;
g - determinar que única
decisão/reação o auditório original é levado a tomar quando ela originalmente
foi contata;
h - discernir o conglomerado
de temas teológicos que a parábola afirma e/ou pressupõe e determinar o que a
parábola está dizendo a respeito desses temas. A ênfase recai sobre mais de um
termo de comparação chamado de símbolos. Os símbolos são válidos hoje ainda,
pois reproduzem verdades eternas.
Enquanto em uma alegoria
cada detalhe comunica um significado especial, os detalhes de uma parábola não
possuem significados específicos, mas são como ilustrações ou imagens para a
narrativa como um todo. Uma parábola visa ensinar uma verdade principal e os
detalhes não podem ser tomados com sentido literal, a menos que o contexto
permita essa interpretação. Somente podemos definir uma doutrina de uma
parábola se esse ensino for confirmado em outras partes da Bíblia, ou seja, de
uma parábola não podemos definir uma doutrina. Atribuir o sentido de hades na parábola do Rico e Lázaro como
fundamento da doutrina da imortalidade inerente da alma é desconsiderar esse
princípio.
Pr. Yuri Ravem
Mestre em teologia e pastor da Igreja Adventista em Sumaré - SP.
Casado com Andressa, mestre em educação e pai do Yan.
Editor Associado do Blog Nisto Cremos
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